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sexta-feira, 14 de agosto de 2015

14/08

2015

Histórias de repórter (90)

No passado, entre as décadas de 70 e 80, os grandes comícios se traduziam nos maiores momentos de uma campanha política. Arrastavam multidões. Que o digam os inesquecíveis atos de rua pelas diretas, já, nas principais capitais brasileiras em 83, embalados pela emenda Dante de Oliveira, que restabelecia o direito do eleitor escolher seus representantes do Executivo pelo voto livre, direto e democrático.
Mais tarde, foi inaugurada um outro modelo: as carreatas, estas apenas para impressionar, movimentar as cidades e engarrafar o trânsito. Raposas políticas testadas nas ruas, no contato com o povo e o calor humano, como Miguel Arraes, lembrado ontem pela passagem do 10º ano da sua morte, inventou as caminhadas em feiras.
No interior, era conhecido como o “acaba feira”, porque quando chegava, de blazer ou apenas vestido de camisa social, arrastava uma multidão nas caminhadas, tirando os fregueses dos bancos de feira. Arraes gostava mais de uma conversa tête-à-tête com o homem simples do campo nas feiras do que ficar em cima de um palanque discursando.
Mito, certo dia, esperado em Afogados da Ingazeira para uma caminhada na feira, na condição de candidato a governador nas eleições de 1994, a oposição se encarregou de espalhar terrorismo entre os eleitores arraestistas. Para tirar o voto de Arraes, valia tudo. As mentiras se espalhavam de forma impressionante, numa velocidade de causar inveja.
Uma delas, de tão hilária, entrou para o folclore e se deu exatamente neste dia em Afogados. Na panfletagem antiArraes, um militante se deparou com um matuto num carro de boi recheado de propaganda de Arraes, do chifre do animal até as rodas fotos de Arraes eram vistas estampadas.
O militante se aproximou do agricultor e quis saber por que ele iria votar mais uma vez em Arraes. "O bico de luz que tem lá no meu alpendre foi Arraes que botou. A água que eu bebo, saindo de um poço, foi Arraes que trouxe. E o leite das crianças, de uma vaca no quintal, é Arraes também que dá”, respondeu.
Vendo que estava difícil mudar o voto daquele cidadão, o agente político da direita apelou para o terrorismo: “Saiba, pois, que se ele for eleito novamente governador, o senhor vai ser obrigado a emplacar seu carro de boi no Detran para andar aqui nas ruas. Ele não tem nada de comunista nem de socialista, ou seja, o senhor vai ter despesas para emplacar seu carrinho de boi”.
Matuto vivo, sabendo que se tratava de um terrorismo que não colava na cabeça de ninguém, o arraesista olhou enviesado em direção ao militante e respondeu com muito humor e sarcasmo:
“Ó vei organizado. É por isso que voto nele!
Histórias assim reforçam, na verdade, a face mitológica de Arraes, que no Sertão também era tratado de “Pai Arraia”. Depois de tantos programas sociais, que mudaram a vida dos sertanejos, como a quase universalização da energia na zona rural, corria solta também a versão de que os mais fanáticos chegavam a fazer chá com a foto de Arraes para se curar de enfermidades.
Exageros à parte, o fato é que Arraes gostava e se divertia ouvindo histórias sobre as manifestações espontâneas do povo. Ao falecer, a 13 de agosto de 2005, Arraes promoveu o último ato de uma longa vida voltada para o mundo da política. Tinha 88 anos e mais de meio século de vida pública. No dia do velório, uma multidão de milhares de seguidores e admiradores postou-se em frente ao Palácio do Campo das Princesas sede do governo do estado de Pernambuco.
Colocaram-se ali em fila, com a pachorra dos fiéis, para se despedirem daquele estranho homem que sabia fazer vibrar seus sentimentos. E embora estivessem distantes os tempos em que a crença no “mito” Arraes era de tal ordem que chegavam a considerá-lo uma espécie de messias capaz de fundar uma nova era de liberdade e bonança, ainda assim, naquele momento, diante de seu corpo, algo dessa chama permanecia ardendo naquele povo todo.
Aguardavam apenas a oportunidade de ver e tocar, uma última vez, aquele homem miúdo, de cabeça enterrada nos ombros, cuja carantonha, marcada pelo indefectível bigode, sempre bem aparado, por aqueles olhos grandes e injetados e uma boca larga de onde saía uma voz rouca, gutural, era a própria expressão de uma pessoa incomum.
Não que fosse, evidentemente, um predestinado, como muitos de seus seguidores se habituaram a considerá-lo, sobretudo os mais humildes e rudes. Mas, precisamente, porque foi capaz de despertar neles esse sentimento desmedido mais ainda porque logrou manter viçosa, mediante uma cuidadosa administração de sua carreira política, essa imagem de guia, que se diferenciava do comum dos líderes políticos de esquerda.

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